sexta-feira, abril 23, 2010

Um Repórter Fotográfico 01


Já ouvi burburinhos de todo tipo sobre a profissão do Repórter Fotográfico, entre tantos de que somos folgados, petulantes demais, curiosos, carrascos, carniceiros, desalmados, enfim, por outro lado, adorados, guardiões da verdade, tradutores do indizível, fantásticos, por aí. Sem dúvidas é uma profissão digna como qualquer outra: batemos ponto, cumprimos pautas, rodamos toda cidade, viajamos, subimos em morros e descemos em grotas, pulamos muros, tudo por uma boa imagem. A essência maior de nossa profissão é a paixão pelo que fazemos. Para nós é tão ruim quanto seja para alguns que caiam em nossas pautas, em momentos difíceis, que geralmente estão envolvidos com algum tipo de contravenção – por isso nos repudiam – mas a culpa não é nossa, é deles que estão envolvidos. Lamento. É minha profissão. O que diz um assaltante na hora que aperta o gatilho pra matar outro cidadão ? O que dizem os corruptos, na surdina, quando desviam a verba pública em seus benefícios ? O que dizem os estupradores para suas vítimas ? Os pedófilos ? Os traficantes de crack e de armas ? O que dizes ? O que tens a dizer da minha profissão ? Lá estamos, olho a olho com o furacão, debruçados em postes e janelas, acocorados, deitados, estirados no chão, com os pés na lama, oras pendurados em cordas, oras sobre cordas, nessa travessia pra eternidade. Contribuímos significativamente com a História, praticamos uma Antropologia de Informação, numa linguagem universal. Na linguagem da fotografia jornalística, que se pratica no cotidiano das pessoas e das cidades, com a pressão impulsionada pela velocidade dos Meios de Comunicação, postamos o que é de fato mais realístico. Oferecendo uma compreensão mínima – chegando mesmo a um nível de se exprimir em plena compreensão – embora navegue em dúvidas nossas mentes, quando, numa primeira visualização do quadro, o olhar encontra algumas respostas suficientes e instantâneas.

No olhar do Repórter Fotográfico está todo um ‘reino’ de conhecimentos, que procura no ambiente do entorno do objeto a composição do quadro, do mesmo modo que qualquer outro Artista ou músico, operando seus instrumentos, compondo. A rotina nesse reino não se repete absolutamente, nem ao passar dos anos, todo dia as pautas são outras, numa média de três pautas no dia a dia dos 250 dias úteis do ano; são 750 pautas cumpridas. A quantidade de fotos por pauta depende muito de cada profissional. Hoje faço uma média de 500 fotos por dia trabalhado (Durante e, principalmente, entre as pautas fotografo também gente nas ruas, aspectos gerais da cidade ou dos ambientes, animais, flores, texturas, ações cotidianas, companheiros do trabalho, pautas futuras, enfim, mantenho a câmara sempre alerta). No período de um ano são acionados 375 mil aberturas de janela pelo obturador, o que na época do filme isso seria quase impossível – É claro que boa parte dessas fotos vai, logo na primeira visualização, para o lixo (cerca de 300 mil), para num final, selecionadas e tratadas, 45 mil fotos para 3 mil publicações/ano. É claro que o equipamento que usamos é preparado para esse rojão. Esse número pode vir a ser muito maior ou um pouco menor, mas é uma média de minha experiência atual.

Na primeira imagem acima, uma primorosa foto do piloto Robson Baracho de O Jornal, durante uma reportagem sobre aspectos negativos e positivos na adaptação do rio com os novos sistemas de lagos e hidrelétricas, esse papo de revitalização. Foi no momento em que fui subir em uma árvore para fazer a segunda foto aqui publicada, a do São Francisco apontando para o Rio São Francisco. Ele estava próximo e quando me viu subir, rapidamente se dispôs a segurar a câmara – para facilitar – e teve essa feliz idéia de me fotografar nessa posição. Obrigado Robinho. São momentos de criação. Estavam lá: A estátua do santo e o rio santo, e toda alegoria do entorno, eu precisava mostrá-los num único quadro, não me restava outra alternativa no momento, senão, em minha essência primata, pendurar-me nos galhos da árvore até vislumbrar o quadro ideal. Na terceira imagem anexa, sobre um banco da praça, o conjunto numa perspectiva mais aberta, lateral.

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quarta-feira, abril 14, 2010

Ilha das cabras, no Grande lago de Xingó

Se bem percebermos, praticamente quase todo o Grande Lago e a Hidrelétrica de Xingó estão no Estado de Alagoas, porém toda estrutura operacional e direção estão no Estado de Sergipe; diz-se que um ex-governador alagoano, quando candidato à vice-presidente da República, negociou os votos da bancada sergipana, oferecendo em troca a Hidrelétrica de Xingó. Blasfêmia ou não, a verdade é que quem domina toda a área hídrica do Parque Xingó é o estado visinho. Nessa viagem nosso condutor, quando questionado por mim quanto a ausência de navegações alagoanos no lago, indagou com um tom de ameaça: “Se colocarem algum barco aqui dentro, nós afundamos”, e sorriu. Me senti triste e ofendido. – Quem era ele ? Pra ter me dito isto !... Se eu sei que tudo no mundo é política. – Silenciado estava, silenciado fiquei... só aproveitando aqueles ares que só no Rio São Francisco tem. Na foto acima, uma panorâmica do Grande Lago, a partir da Ilha das Cabras, sobre o pedestal que dá suporte a escultura de Jesus Cristo de braços abertos, fiz a tomada da visão desse ser iluminado e único, sobre esse mundo de águas calmas... no reino da Paz.

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segunda-feira, abril 12, 2010

Pelas Ruas da Cidade 006


À Sheila Lins

A cidade dos automóveis não suporta os idosos... Para esta sociedade os idosos pra nada servem... Principalmente se for pobre... Assisto cotidianamente o sofrimento, a humilhação, o descaso... É triste. Dura realidade... A vida dura muito pra passar e é muito dura pra essa gente.

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quinta-feira, abril 08, 2010

O Sonho de um Jaraguá para todos


Da arquitetura histórica de Maceió, o único conjunto preservado ainda está no bairro do Jaraguá. Houve no final do século passado e início desse século, uma tentativa de revitalização através de incentivos internacionais, o Bird, fazendo da Rua Sá e Albuquerque, e do seu entorno, um privilegiado ambiente boêmio, ponto de encontro obrigatório da população maceioense. Mas a desorganização estrutural, a falta de sensibilidade política, tanto da administração municipal como dos proprietários de bares, restaurantes e similares, culminou numa só decepção. Maceió continua sem ter um lugar para se levar a família para um passeio, a não ser a nossa orla atlântica, com ambientes muito aprazíveis. Lembro que na época que acontecia o movimento de revitalização falou-se em transformar a Sá e Albuquerque em um imenso calçadão, o que a meu ver seria a grande saída, idéia maravilhosa, com espaços para performances, shows, exposições, feiras livres, etc. É lamentável perceber que nossas políticas públicas não vislumbram interesses públicos, parece-me que vislumbram apenas o que entra em vossos bolsos. Vamos acabar com isso, gente ! Que coisa mais feia essa corrupção institucionalizada ! Esse derrame de verba pública desviada em orçamentos barateadores ! Essa má distribuição de renda ! Os Poderes bem aquinhoados e toda estrutura pública largada às favas ! Até quando essa doença que o Kapitalismo impregna no âmago das almas, diante um universo globalizado, se estenderá ?!... Tanto dinheiro do bolso desse povo. Pra nada. Que dizer, pro esquecimento de tudo... Let it be.

Essa imagem é a fusão de duas fotos em lente de grande angular, 16mm, ainda em filme, com aplicação de efeitos e ferramentas do Photoshop CS2.

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terça-feira, abril 06, 2010

Na Estrada 003


plaustrum do Lácio

Presentes no cotidiano dos pequenos vilarejos de todo Sertão brasileiro, os barulhentos e folclóricos carros de bois deslocam-se vagarosamente, ao comando do carreiro, conduzindo a produção local e por vezes gente; foi o primeiro veículo de transporte desde o Brasil Colônia e Império, escrevendo os primeiros capítulos da história do povoamento. Até hoje, mesmo com toda sua morosidade característica, sempre muito útil, na missão multissecular de transporte popular.


Carro de Boi
Autor: Tonico

Meu véio carro de boi, pouco a pouco apodrecendo
Na chuva, sor e sereno, sozinho, aqui desprezado
Hoje ninguém mais se alembra que ocê abria picada
Abrindo novas estrada, formando vila e povoado

Meu véio carro de boi, trabaiaste tantos ano
O progresso comandando no transporte do sertão
Hoje é um traste véio, apodreceu no relento
No museu do esquecimento, na consciência do patrão

Meu véio carro de boi, a sua cantiga amarga
No peso bruto da carga, o seu cocão ringidor
Meu véio carro de boi, quantas coisa ocê retrata
A estrada a verde mata, e o tempo do meu amor

Meu véio carro de boi, é o fim da estrada cumprida
Puxando a carga da vida, a mais pesada bagage
E abraçando o cabeçaio, o nome dos boi dizendo
O carreiro foi morrendo, chegou no fim da viage.

(http://www.widesoft.com.br/users/pcastro1/carrodeboi.htm#carro)

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domingo, abril 04, 2010

Mal -me-quer Bem-me-quer


Tenho falado, que há um grande problema no fotojornalismo, quanto à foto-arte, devido ao momento e ao relógio. Não podemos perder tempo parando em cada canto que chegamos, muito menos devemos nos desconcentrar da pauta, principalmente para ficar fotografando ‘florzinhas’... Temos sempre de nos desdobrar para arrumar um jeitinho pra fazer aquela foto que tá ali, que a sensibilidade poética do jornalista da imagem percebeu. A pauta é geralmente completamente outra. Como nesse caso. Não especificamente, pois adoro fotografar as flores, tenho uma coleção maravilhosa de uma porção delas. Adoro rever meu arquivo de flores. Tem pra lá de mil. Todas as cores, plenas, lindas, sei nome de quase nenhuma, não importa, as fotografo. Às vezes elas ficam com péssima iluminação, outras vezes perdem o foco (que não fiquem muito borradas), corta um pedaço, enfim, acho que tento captar um pouco de tudo do que vejo... Pra mim a poesia está em todo lugar, às vezes minuciosos, outras vezes absolutos... Sensibilidade se aprende, sim, praticando, tudo se aprende; se aprende a ver, se aprende e se modifica, a mente humana se adapta – É incrível ! – às mutações. Crescemos com o conhecimento. A curiosidade é a marca da coragem aplicada – Porque não ?! – nas ações que praticamos no cotidiano. A última pétala murcha, prestes a mergulhar na queda existencial da renovação vegetal – Mas que sentido tem essa florzinha murcha aí ? Pergunta o cético – o que me fez vislumbrar uma brincadeirinha dos apaixonados, que arrancando, uma a uma, as pétalas de uma flor, dizendo a cada uma ‘mal-me-quer’ e próxima ‘bem-me-quer’, até a última que restar, que pode ser mal ou bem me quer. Apaixonadamente...

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sábado, abril 03, 2010

O Pescador de Sururu


O homem pega sua canoa, dois remos compridos, com sacos de nylon trançado de uns 50 litros, cheios de garrafas PET tapadas, cheias de ar, pendurados e ligados por uma corda; rema até entre 20 a 60 metros da orla, onde enfinca os remos juntos na lama do fundo das águas escuras da lagoa e amarra a canoa na ponta deles. Aí então ele mergulha. Vai lá no fundo. São mergulhos de 2 a 2,5 metros de profundidade, em média. Enfia as duas mãos, cavando um buraco, na lama e ergue a massa em direção ao seu peito, sobe rapidamente para a superfície, levanta a massa até a altura da borda da canoa e joga para dentro o volume de lama que fora possível trazer. E volta a mergulhar - dezenas de vezes - enquanto a canoa começa a afundar com o peso de tanta lama, fica flutuando graças aos sacos com garrafa PET que agem como bóias; entre vários mergulhos, apalpa agressivamente a lama, separando-a do marisco fino e comprido, em cachos; e mais esporadicamente, sobe na canoa e movimenta os pés em ‘pedaladas’ consistentes, diluindo a lama que se esvai com o movimento das águas, nesse momento o movimento de suas pernas lembra um motor, liquidificando aquela porção heterogênea, separando o sururu da lama. Isso durante 4 a 6 horas por dia, todos os dias. O pescador de sururu de Maceió e a lama da laguna Mundaú têm a benção eterna do cotidiano paralelo: como o pássaro que mergulha na caça, como o caranguejo que vive mais intensamente a lama, hora afundado, hora emergido, mergulha pra ganhar a sobrevivência.

Essas fotos foram feitas em uma Nikon FM10, um filme de iso.400, durante a produção do documentário Mirante Mercado, dirigido por Hermano Figueiredo, do qual fui Assistente de Produção.

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sexta-feira, abril 02, 2010

Cabeça de Alguma Coisa


O espectro de um animal, perpassado e pendurado por um arame farpado, do que restou de mais uma árvore cortada. Uma máscara presa. Uma cerca infinita, rodeando e delineando, palmo a palmo cada pedaço desse chão. Pelo ver, há anos que a árvore e o arame farpado comungam, sob pressão, esse elo da madeira que cede com o metal que corta, feito o pingo da água que de gota em gota fura a pedra. Para tanto uma sinergia mística completa esse quadro ‘fantástico’, com a presença do fotógrafo que registra. Mística porque, em uma longa viagem, uma parada forçada para aliviar a vontade de urinar, levou este repórter fotográfico ao exato local. Alguns metros pra cá, alguns metros pra lá, não haveria certamente esse flagrante subjetivo, essa natureza morta, essa arte explícita que navega a percepção óptica do autor. Poesia ! Poesia ! Poesia !

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Série Mergulho do Coqueiro


Trabalhei desde 1985 como ‘agente publicitário’, diga-se Poemídia, até que em 2002, de passagem por Maceió, uma amiga de Minas Gerais resolveu vender uma câmara Nikon F3 e algum equipamento, me oferecendo. Durante alguns meses refleti, estava cansado de fazer artes gráficas (autônomo). Tudo culminou com o lançamento de um novo jornal, o “Primeira Edição”, não deu outra: comprei o equipamento no início de 2003. A partir dali tudo mudou, houve um processo de transformações muito grandes em minha vida, agora numa versão poética imagética, mergulhei de cabeça no fotojornalismo, mudei diversos costumes, encontrei singularmente com minha profissão. No primeiro filme que coloquei na câmara, tive o prazer de encontrar em meu caminho essa prática esportiva da meninada do bairro do Pontal da Barra: O “Mergulho do Coqueiro”. Acho que foi aqui que eu percebi, que através das imagens poderia tocar minha’lma Poemídia, que a poética da linguagem da imagem sempre fora a essência desse projeto que não tem fim, que é a prática existencial que alimenta os anseios dos meus dons de poeta.

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